segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Vovó Cleusa

Bolacha de água e sal com leite condensado. Cheiro de bolo fresquinho. Suco de acerola, da aceroleira do quintal que vivia carregada. As aulas de música que eu nunca tive maturidade para terminar. A voz do Silvio Santos invadindo a casa. Todos os domingos, religiosamente: frango assado, com batatas e macarronada. As lições de crochê. Os sapatinhos de bebê de tricô, que eram sempre para o filho de alguém. A jogatina semanal, que era de lei, porque ninguém é de ferro. O gatinho que te adotou e você me deixou batizar de Sushi.
As histórias que ouvi incontáveis vezes: que seu pai era um artista, que seu primeiro namorado foi um maestro, que você fez um zilhão de docinhos para o casamento da minha mãe, mas o vovô não quis fazer festa. A descoberta da internet, com direito a comentários embaraçosos nas minhas postagens. A sua preocupação comigo em estar sozinha em uma cidade tão grande, ou de eu estar sozinha e ponto.
Você partiu vovó e eu fiquei tentando lembrar dessas coisas todas, na tentativa de te trazer de volta. Eu sei que estava difícil, que a vida já não tinha o mesmo sabor, que a saudade era demais de quem já se foi, mas nem assim sua ausência fica mais fácil de aceitar.
Quisera eu voltar no tempo e aproveitar mais o nosso último abraço. Lembro que a gente chorou, e eu por isso depois de muito tempo, tive vontade de ficar. Sei que se eu tivesse ficado não teria mudado o que aconteceu com você, nem diminuido sua dor, mas eu queria que você soubesse, que eu quis muito ficar.
Dorme vovó querida. Descansa, que ao acordar estarão te esperando felizes ai do lado de lá.

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