domingo, 11 de agosto de 2013

Meu querido professor.


Quando eu resolvi virar motorista nessa vida, tive um professor, ou melhor dizendo, um cúmplice muito especial: meu pai. 

Ele era representante comercial, vendia farinha para padarias e supermercados de Anápolis e cidades vizinhas, então viajava bastante. Me lembro que vez ou outra ele me deixava acompanhá-lo. Não era bem um passeio, porque afinal de contas ele estava trabalhando, mas eu gostava das viagens, muitas vezes até demoradas e cansativas, simplesmente pela companhia singular do meu pai. 

A gente parava em cada espelunca pra comer, até penso que pra ele quanto mais sujo o lugar mais gostoso era; e por muitas vezes as visitas eram mais demoradas do que o esperado e eu ficava no carro, sem nada pra fazer. Mesmo assim o percurso era o mais divertido do mundo, regado à música boa, à saudosas histórias que ele contava ou só ficávamos calados apreciando a paisagem de um por do sol e ele sempre, como se fosse um ritual, dizia "eu adoro pegar estrada, melhor que terapia né?" e eu sempre balançava a cabeça concordando.

Aos 16 anos quase 17, voltando de uma dessas viagens, ele parou o carro no acostamento e me disse "Vou te ensinar a dirigir como meu pai me ensinou a nadar! Ele me jogou no rio e disse: agora nada!". E foi assim que sentei no banco do motorista pela primeira vez, pra dirigir numa BR e dirigi. Loucura ou irresponsabilidade dele, eu não saberia dizer, mas o fato é que sobrevivemos aquele episódio, sem nenhum arranhão e com o carro intacto. Tudo bem que a estrada não estava tão movimentada assim e já era final de tarde. Eu estava tão tensa que achava que não poderia respirar e dirigir ao mesmo tempo. Ele me deixou dirigir até a entrada da cidade, onde trocamos de lugar e ele me olhou com orgulho e disse "Agora você está pronta pra ter aulas de verdade".

Depois disso, tive aulas semanais de direção, com ele claro. Meu pai tinha um golzinho velho, daqueles quadradões, sem direção hidráulica e as aulas eram mais divertidas pra ele do que pra mim, que me sentia como se nunca fosse capaz de fazer aquilo direito. Quando ele pedia pra eu dar ré, eu achava que era missão impossível, não conseguia fazer curvas fechadas, tinha uma dificuldade tremenda de distinção entre esquerda e direita (não que hoje, isso tenha mudado muito)...Ah! E ainda tinha que aprender a dirigir e respirar, complicadíssimo! O ápice da diversão dele foi um dia que ele me pediu pra fazer uma rampa e eu pisava fundo nos pedais, alternado entre o freio e o acelerador. O carro fazia um barulho ensurdecedor e eu já desesperada apelei com o meu pai que ao invés de me ensinar só sabia gargalhar, segurando a pancinha cultivada à muito chopp. Eu sai do carro quase chorando e disse que nunca mais queria saber de dirigir.

Ele pacientemente me mandou voltar pro carro e disse "Jhoythinha, não coloquei filho no mundo pra ser bundão não!". Me ensinou a fazer uma rampa decente e desde então eu me esforçava pra ser tão boa motorista quanto ele. E até hoje assim eu faço, como motorista e como pessoa, eu me esforço pra dar orgulho ao meu pai. Ele não me deixou dinheiro, nem bens, mas me ensinou a ser uma pessoa de bem,  a não ter medo da vida e principalmente a ser uma excelente motorista!

Hoje uma amiga me perguntou se eu ficava triste no dia dos pais, por não ter mais o meu comigo. A resposta foi não sem nem pensar muito, porque eu não consigo associar tristeza a meu pai. Alegria era o que o traduzia, e sendo assim fica impossível que qualquer sentimento ruim tenha lugar no meu peito na lembrança dele. Eu só sinto saudade, principalmente quando vejo um por do sol na estrada e dou muita risada de lembrar de meus episódios automotores, que foram tão peculiares graças às participações especiais do Seu Carlinhos. Feliz dia dos pais, papai!





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